Confesso que há uns anos deixei de ver o festival da canção, uma vez que considerei que a maior parte das músicas não representavam as referências da cultura portuguesa, ou mesmo que não representem, que tenham pelo menos alguma musicalidade, letra razoável e figurinos também
Houve só um artista que me fez ainda acender a esperança e ouvir uma música razoável que fosse…. Salvador Sobral. Aquela belíssima performance ditada da alma, quase nula de efeitos de palco, e efeitos visuais mínimos….fez me acender a esperança que Portugal pode marcar pela diferença…. Mas pela positiva. Pelo que realmente importa ou deveria importar num concourso deste âmbito, o valor da composição musical e letra, a riqueza nas orquestrações e não nos efeitos visuais ou nas vestes e postura dos cantores….
A partir de então, comecei novamente a acompanhar o Festival, procurando aquela esperança…. Alguns anos seguiram com a desilusão de musicas que ascenderam mas que nada representavam nem Portugal nem sequer musicalidade em si, com denominações como algo inovador, diferente, e que até o próprio cantor confessou que não percebia nada de musica, só fazia umas mixagens musicais….. Esse ano foi o descalabre. Acho que os jurados estavam todos K.O., como era possível uma musica dessas chegar à final. Graças aos céus a comunidade internacional, não a deixou passar e colocou os pontos nos is…. Falo da musica Telemóveis…..
Mas quero é agora falar deste festival da canção, de 2024. Confesso que não me desiludiu, até me surpreendeu!
Reparei que este ano a maior parte das músicas que foram a concurso foram escritas e elaboradas pelos próprios, o que é excelente, uma vez que dá espaço aos artistas fazerem valer da sua criação e não estarem singrados aos mesmos letristas de sempre. Dar espaços aos novos. Os velhos já tiverem o seu lugar.
Uma grande surpresa foi ver Maria João, com a música DIA, jazzística! Uma salva de palmas à coragem de colocar uma música de jazz num festival da canção!
Ver Maria João foi uma delícia imaginativa, a sua performance, a sua belíssima colocação de voz, e conteúdo de letra, é viajar pelas suas palavras, gestos e na nossa cabeça desnrola-se uma história. É como olhar um quadro abstrato e imaginar o que lá está. Não acredito que vá ganhar, por pena, uma vez que a musicalidade e vocais são bastante elaborados e dissonantes, para ouvidos apurados. Mas para mim seria a vencedora!
Também surpreendeu a musica Doce Mistério de Leo, também uma das fortes candidatas a vencedora. Que delicia viajar nas sonoridades tropicalistas de Caetano, na bossa nova da velhar guarda brasileira, a chamada MPB. Leo esteve à altura de fazer o revivalismo de Caetano Veloso.
Outra música surpresa, foi Change, de Silk Nobre, um funk, (graças aos céus, não é funk brasileiro!!!) mas funk Inspirado no soul, no jazz e no rhythm and blues (R&B), funk norte americano. Eis aqui uma ousadia que funciona bem num festival. No entanto é cantado em Inglês. Ponto muito em desfavor. Penso que o Festival da Canção deveria ser só representado por canções em português. Imagine se todos os países começam a levar canções em inglês, deixa de ser um festival universal para ser um festival de língua inglesa. Orquestração ótima, vocais maravilhosos, que pena a letra ser na totalidade em inglês…..
Por fim, vale a pena falar do Farol, de Buba Espinho, balada bonita, com nuances de guitarra portuguesa, letra intemporal que fala sobre o derradeiro tema «amor». Linda musica mas sem força para um festival da canção. Mas sim, é uma das minhas favoritas.
Estas foram as surpresas da segunda semi-final do Festival da canção.
Em resumo, fico feliz que este ano tenha havido uma maior preocupação na seleção da escolha dos candidatos, pela letra, sonoridade musical, e não tanto pela procura de algo diferente e novo….. esse ingrediente não resultou no passado e deixou Portugal no ridículo.
Este ano, espero que Portugal recupera alguma dignidade musical!