Os representantes das comunidades asiáticas com raízes portuguesas reuniram-se em Díli, Timor-Leste, durante a 4.ª Conferência das Comunidades Luso-Asiáticas (APCC), realizada de 27 a 29 de junho de 2015.
O encontro teve como tema “Unidos na Diversidade – Desafios e Oportunidades de um Legado Secular” e culminou com a criação oficial da Associação das Comunidades Luso Asiáticas (APCA), formalizada com a assinatura da Declaração de Díli.A conferência promoveu o diálogo e a preservação da língua, cultura e história partilhadas por comunidades de oito países: Malásia, Myanmar, Sri Lanka, Tailândia, Índia, Indonésia, China e Timor Leste. O evento destacou o papel de Timor-Leste como único país asiático de língua oficial portuguesa, sendo considerado um ponto de encontro e símbolo de união para essas comunidades. Um belo exemplo para a consolidação da Lusofonia! No dia 18 de julho de 2025, realizou-se em Bissau a XV Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Entre as diversas conclusões, foi triste a posição de Portugal, através do Ministro dos Negócios Estrangeiros Jorge Rangel, que impediu referências à fome em Gaza na declaração final. Esta posição vem na linha do não reconhecimento do Estado da Palestina, demonstrando seguidismo relativamente à União Europeia, embora alguns países como a Suécia, Espanha, Irlanda e Eslovênia, França e outros já o tenham feito ou estejam prestes a isso. Um mau exemplo relativamente à constatação da realidade!
Na nova Lei de Estrangeiros, que o PR enviou para o Tribunal Constitucional, desaparece o visto de trabalho CPLP e é mais difícil para os imigrantes o reagrupamento familiar. Moçambique e Angola já demonstraram o seu descontentamento. Outro mau exemplo do Governo AD/ CDS/ Chega (quase)! Voltando à APCC, os participantes relataram a diversidade de experiências: em Malaca (Malásia), a língua portuguesa ainda é falada entre famílias unidas por uma forte identidade cultural; no Sri Lanka, sobrevive um português crioulo influenciado pelo tâmil e pelo cingalês; em Jacarta (Indonésia), o crioulo Papia Tugu está praticamente extinto, mas permanece vivo através da música keroncong, criada pela comunidade luso descendente.
A criação da APCA visa valorizar essas comunidades, muitas vezes esquecidas, e promover o seu reconhecimento, incentivando a educação, a pesquisa e o desenvolvimento cultural e económico. A associação será uma rede de cooperação que une tradições e histórias comuns, respeitando as particularidades de cada povo. Criar a associação, como explicou o presidente da República Democrática de Timor-Leste, José Ramos-Horta, é uma f orma de reconhecer o valor de comunidades luso-asiáticas, geralmente ignoradas e desvalorizadas, e dar voz a possíveis diálogos com governos e instituições internacionais.
Earl Barthelot, presidente do Grupo “Burgher Folks”, de Batticaloa, no Sri Lanka, falou no português crioulo, a versão antiga do português, que foi sofrendo alterações ao longo dos tempos. “Quando os portugueses conquistaram o Sri Lanka, não trouxeram mulheres de Portugal, casaram-se com locais e fizeram negócios, levando coisas do Sri Lanka para Portugal, através de Goa, na vizinha Índia” A língua que era utilizada nos negócios foi sofrendo alterações, estruturais e gramaticais, até pelo contacto com as duas línguas principais do Sri Lanka: o cingalês e o tâmil.
O português crioulo não é usado todos os dias, mas as pessoas conseguem dizer, por exemplo: ‘estou a tomar café’ – ‘eu avora teat boe”. Em Malaca, a história é diferente. Marina Linda Danker, dona do grupo cultural português de Malaca – Dom Marina –, contou que são descendentes dos portugueses de 1511 e conservam a língua portuguesa de Malaca dos séculos XVI e XVII.
Vivemos numa aldeia onde todos são portugueses e católicos romanos. Praticamos todas as nossas tradições, incluindo as que estão ligadas à religião. Os números, um, dois, três, e até alimentos e temperos dizemos em português: cebola, gengibre”, explicou, acrescentando que há outras comunidades que podem já não falar português por viverem isoladas e não conseguirem usar a língua todos os dias. A comunidade em Jacarta, na Indonésia, já não fala português, uma vez que o Papia Tugu, a língua crioula falada pelos portugueses nos arredores de Jacarta, é considerada extinta.
“O português crioulo que temos não é o português moderno, nem autêntico. Chama-se Papia Tugu”, explicou Guido Quiko, líder comunitário na aldeia portuguesa de Tugu e do grupo musical Tugu Keroncong. É o grupo musical que acaba por manter o legado do Papia Tugu, através de canções escritas naquele crioulo português javanês. Em Jacarta, dizem ‘yo kere bebe’ (eu quero beber) e ‘yo kere pasa’ (quero dar uma volta). Como não usam a língua todos os dias e por falta de vocabulário, os resquícios da língua portuguesa foram desaparecendo, misturando-se com línguas das regiões da Indonésia, desde meados do século XVIII. “Temos apenas algumas canções compostas pelos nossos pais: Kaprinyo, Gatumatu, Yankagaleti e Meninabobo. Estas são as que ainda cantamos com frequência. Mas o nosso conhecimento da língua não é suficiente para manter uma conversa”. As canções – Kaprinyo, Gatumatu, Yankagaleti e Meninabobo – foram tocadas ao longo da conferência em Díli. (Ver o meu texto de 2020 “Banda sonora para uma presença oculta na Indonésia: o keroncong”). “Em Batávia, em 1661, os holandeses impunham duas condições a quem quisesse viver na região: converter-se ao catolicismo ou ao protestantismo e substituir os apelidos portugueses por apelidos holandeses”, contou Guido Quiko.
A música Keroncong surgiu pela falta de divertimento naquele local, já que viviam isolados. Para ter entretenimento, tinham de caminhar 23 km, desde a vila Tugu, até à cidade de Atuwa. Criaram um instrumento musical, de cordas, com a forma de um cavaquinho, que ficou conhecido como ‘macina’. “Tem o formato de uma pequena viola e, quando tocado, emite um som metálico ‘chong chong’ [tenta reproduzir o som], então chamaram-lhe “keroncong”. Foi assim que surgiu a música keroncong na Indonésia, com a qual a comunidade se divertia depois do trabalho, ou durante o dia, a pescar ou a caçar. Quando os holandeses ouviram que havia eventos musicais naquela aldeia isolada, foram lá, juntaram as pessoas, e levaram instrumentos musicais europeus.
Mais tarde, foi instituída uma Orquestra em 1925: ‘Orkes Pusaka Keroncong Moresko Tugu’, que agora se chama Tugu Keroncong. O programa conta ainda com a participação de diversos académicos e f iguras sonantes de territórios como Goa, Macau e Timor. Quanto à presença portuguesa na Tailândia, os dois países têm uma história de sorrisos que dura há cinco séculos. Fomos os primeiros europeus a lá chegar e ainda hoje há um pouco de nós presente em muito lado, o que dá sempre um belo motivo para iniciar uma viagem. A 4.ª Conferência da APCC serviu ainda para destacar o papel de Timor-Leste como a única nação asiática que tem o português como língua oficial.
O facto de ser membro da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP), de estar associado aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e de estar já com um pé na Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) ainda dá mais peso ao papel de Timor Leste na região. Muita da informação apresentada neste texto foi organizada após consulta ao site https://www.diligenteonline.com, interessante plataforma criada por um grupo de jovens jornalistas timorenses “ansiosos por melhorar a indústria dos media no nosso país”. Queremos difundir informação imparcial que possa ajudar as pessoas a enfrentar todas as questões sociais e económicas com pensamento crítico.