Após a publicação da minha crónica “Leopoldo Rodrigues e os 27 Assessores: O Império de Castelo Branco” no jornal Online “ORegiões” , decidi aceitar o convite do Presidente da Câmara de Castelo Branco, Leopoldo Rodrigues, que, com a sua habitual generosidade, se dispôs a mostrar-me o “mapa de pessoal” para esclarecer na verdade, como se tal pudesse fazer alguma diferença na gestão desastrosa da cidade. Afinal, se ele diz que tem assessores que “ajudam o presidente na tarefa de pensar”, quem sou eu para contestar? A viagem até ao gabinete do senhor Presidente foi curta, mas cheia de surpresas e revelações que, honestamente, me deixaram com mais dúvidas do que respostas.
Na conversa Leopoldo Rodrigues ainda tentou dar uma lição ao jornalista, que uma crónica não existe no jornalismo: então aqui vai a explicação que lhe dei em forma sucinta, uma crónica é: “Em sentido tradicional, traduz o relato ou narrativa de factos dispostos por ordem cronológica, por ordem da sua sucessão”.
“Salvato Trigo afirma que “a crónica e o folhetim, e mais tarde a grande reportagem, aparecem-nos como espécies discursivas mistas pertencendo, a um tempo, ao jornalismo, pela sua quotidianidade, e à literatura, pelo imaginário que as acompanha” (AAVV, s.d.: 13). Martinez Albertos refere-a como “um género híbrido” (ALBERTOS, 1982: 123), misturando o estilo informativo e o estilo editorializante; Martin Vivaldi como “género ambivalente”, sendo “em essência, uma informação interpretativa e valorativa de factos noticiosos, actuais ou actualizados, onde se narra algo ao mesmo tempo que se julga o narrado” (AAVV, s.d.: 45). Alice Vieira defende a existência de dois tipos distintos de crónica, a jornalística e a literária. A escritora e jornalista diz que a crónica “está na fronteira, é como que o “salto para a outra margem”. Pode ser tipicamente jornalística mas pode ter um estilo literário. Pode realmente ser considerada uma obra literária, mesmo sendo publicada no jornal”. Mas adverte:
o rigor deve estar sempre presente nesta “efabulação de uma história”. Gil Tovar afirma que é um “relato vinculado à cronologia e rico em observações” (AAVV, s.d.: 45). José Marques de Melo diz-nos que “a crónica, na imprensa brasileira e portuguesa, é um género jornalístico opinativo, situado na fronteira entre a informação de actualidade e a narração literária, configurando-se como relato poético do real” (AAVV, s.d.: 47), António Cândido caracteriza-a como “género literário menor” (AAVV, s.d: 51), Victor Silva Lopes define-a como “pequeno texto narrativo que se ocupa de um episódio (às vezes banal ou insólito) do quotidiano. O cronista prevalece o comentário, numa linguagem expressiva, por vezes poética, mas simples e clara” (AAVV, s.d: 50), José Jorge Letria e José Goulão, embora realcem a dimensão literária e ficcional da crónica, afirmam-na como “género jornalístico, o que mais contactos tem www.bocc.ubi.p”
Na sua grande secretária, o presidente espalhou um molho de folhas A3 com nomes e departamentos e disse ironizando: “tenho 591 assessores, que são os funcionários todos da câmara”. Ah, os assessores! Segundo Leopoldo Rodrigues, a sua equipa de verdadeiros assessores só vai de 4 a 6 pessoas. Sim, são esses os “super-heróis” que ajudam a iluminar o caminho do Presidente na sua missão de transformar Castelo Branco numa cidade de grandes obras. Claro que ele explicou que, com esse número tão reduzido de assessores, estava “mal assessorado”, mas ao mesmo tempo, a culpa das desgraças que vemos espalhadas pela cidade – ou a falta delas – não é só de quem o acompanha. A responsabilidade última, claro, é sempre do Presidente. E assim, de forma generosa, o senhor Rodrigues colocou-se a si mesmo como o grande responsável pela cidade “limpa, arejada” e com “focos de obra aqui e acolá”. Focos de obra… Será que ele estava a referir-se a guindastes ou a esses imensos buracos que encontramos nas ruas? Ou será que estas obras só existem mesmo na sua mente? Talvez ele esteja a falar de um futuro que, à vista desarmada, está longe de se concretizar.
A grande revelação do encontro foi, no entanto, a definição do que é realmente um assessor. Segundo o Presidente, “os verdadeiros assessores são só meia dúzia de pessoas, os outros são funcionários da câmara que ocuparam lugares em vários serviços.” Ah, claro, as promessas de que a cidade está cheia de gruas, mas quando olhamos à nossa volta, só vemos as sombras de algo que nunca chega a acontecer. O único trabalho real que parece estar a ser feito é a preparação para as eleições autárquicas de 2025. Um jogo de estratégia, onde tudo se desenrola no papel, aguardando que a magia da política consiga, num abrir e fechar de olhos, transformar Castelo Branco numa potência de obras e desenvolvimento. Sim, sim, “se ganharmos as eleições”, como ele mesmo disse. A certeza da vitória já está em jogo, pois se o presidente acredita que vai conseguir vencer as eleições apenas com promessas de obras, então, estou descansado.
Agora, sobre o vice-presidente, Hélder Henriques, que se afastou do seu cargo a tempo inteiro para se tornar um simples vereador em regime de não permanência, ou sobre a vereadora Patrícia Coelho, que também se encontra a meio gás, é fácil ver que, de repente, Leopoldo Rodrigues se vê forçado a vestir o “fato de macaco” e, como um super-herói, voar para tentar resolver todos os problemas da cidade. O Presidente agora é o “Super-Homem” da autarquia. Como se o tempo e a energia de um único ser humano fossem suficientes para resolver os problemas de uma cidade que, pelas palavras do próprio, está mais “arejada” do que nunca. Um homem só para todos os problemas. O que poderia ser um épico, acaba por ser uma tragédia de fantasia política.
Ao fim de tudo, não resisti e dei uma sugestão ao presidente: abrir a pista de gelo às escolas para que as crianças possam usufruir durante a época natalícia. Não fosse o facto de ele me ter dito que queria mostrar-me as suas obras em breve, e eu teria ficado com a sensação de que estava mesmo a ser sincero. Mas, ao despedir-me, dei-lhe uma farpa: “Aguardo o seu convite para visitar as obras no terreno. Mas tenho que aguardar que saiam do papel primeiro, porque em 9 meses que faltam, será difícil realizar tanto.” Claro, o Presidente riu-se e tentou desviar o assunto, mas, como se diz no popular: “uma mãe demora 9 meses a parir uma criança, a não ser que seja prematura”. Vamos ver se a cidade de Castelo Branco também vai nascer prematuramente ou se o Presidente vai conseguir, com a sua capa de super-herói, cumprir a missão que se auto-atribuíu. Só o tempo dirá.