Maioria dos arguidos que aceitou falar em tribunal admite ter chamado “assassino” e “genocida” tanto a Ferro Rodrigues como a Gouveia e Melo, mas negam qualquer tentativa de agressão. Julgamento foi interrompido quando um dos acusados disse que se aproximou do almirante para lhe “fazer um manguito”
O Tribunal Central Criminal de Lisboa não conseguiu notificar o almirante Gouveia e Melo para depor como testemunha no processo em que terá sido vítima de ofensas e tentativas de agressão durante uma visita a um centro de vacinação no verão de 2021, em plena pandemia de covid-19.
Pedro Ribeiro, que está a ser julgado por tentativa de agressão a Gouveia e Melo, admitiu no primeiro dia do julgamento ter-se aproximado do almirante para gritar “Capitão Iglo, paga-me um shot” e, mais tarde, para lhe “fazer um manguito”. A confissão arrancou gargalhadas aos restantes arguidos, uma repreensão da juíza Sandra Carneiro que exigiu “respeito” e um pedido de interrupção por parte do advogado que representa este “empresário de comunicação” que foi imediatamente aceite pelo tribunal.
O ex-presidente do parlamento Ferro Rodrigues disse esta segunda-feira, durante o julgamento dos `negacionistas` acusados de injúrias e tentativas de agressão contra si e Gouveia e Melo, que existe uma perseguição contra a sua imagem e a extrema-direita está envolvida.
“Há uma perseguição consciente, há muitos anos, contra a minha imagem, em que a extrema-direita portuguesa está totalmente envolvida”, sublinhou o antigo presidente da Assembleia da República, na primeira sessão do julgamento que conta com dez arguidos acusados dos crimes de ofensas à integridade física agravada na forma tentada, injúria agravada, ameaça agravada e dano qualificado na forma consumada.
Eduardo Ferro Rodrigues foi a primeira testemunha a ser ouvida no âmbito deste processo e, de acordo com a acusação do Ministério Público, o político socialista terá ouvido os insultos “pedófilo” e “assassino” quando entrava num restaurante na zona de São Bento, em Lisboa, em setembro de 2021.
“Ouvi todas as expressões que estão na acusação do Ministério Público. Lembro-me bem. `Pedófilo`, para mim, é muito grave”, disse, perante o coletivo presidido pela juíza Sandra Carneiro.
Em relação a este insulto, o ex-presidente da Assembleia da República considerou ainda que esta é “uma calúnia que foi instalada em 2003”.
“Passados 20 anos, voltou a aparecer na comunicação social, sobretudo nas redes sociais, na internet e nas televisões, devido à participação destes senhores”, acrescentou, referindo-se aos arguidos.
Manifestantes exaltados
Durante a tarde, foram também ouvidos em tribunal vários agentes da PSP que estavam em Odivelas quando Gouveia e Melo foi ao centro de vacinação, e em São Bento, quando Ferro Rodrigues terá sido insultado ao entrar e sair de um restaurante.
Maria Silva, do corpo de segurança do antigo presidente da Assembleia da República, chegou a identificar em tribunal uma das arguidas como sendo a mulher que lhe terá puxado o cabelo. Esta testemunha confirmou ainda os insultos dirigidos a Ferro Rodrigues e a dificuldade que as forças de segurança tiveram para afastar os manifestantes.
Em relação ao episódio que envolveu Henrique Gouveia e Melo – que o tribunal não conseguiu notificar para depor hoje em tribunal como testemunha -, a agente da PSP de Odivelas Cátia Cardoso admitiu que as pessoas estavam mais exaltadas quando Gouveia e Melo saiu do centro de vacinação.
“Estavam mesmo muito agressivas, tenho a certeza de que se nós não estivéssemos lá, iam para ele (Gouveia e Melo), sem sombra de dúvida”, explicou.
O processo chega agora a julgamento, depois de o Tribunal Central de Instrução de Lisboa ter decidido, em dezembro de 2024, que existiam indícios suficientes para julgamento de dez dos 12 arguidos pelos crimes de ofensas à integridade física agravada na forma tentada, injúria agravada, ameaça agravada e dano qualificado na forma consumada.
De acordo com a acusação, em causa estão episódios que aconteceram durante a pandemia. Um deles ocorreu em agosto de 2021, quando os manifestantes negacionistas gritaram “assassino” e “genocida” contra Gouveia e Melo, então coordenador da `task force` do plano de vacinação contra a covid-19, junto ao centro de vacinação em Odivelas.
O outro aconteceu um mês depois, junto ao parlamento, quando chamaram “pedófilo” e “nojento” a Ferro Rodrigues, quando este se deslocava a pé com a mulher para almoçar num restaurante nas imediações.
O Ministério Público constituiu doze arguidos, mas alguns pediram a abertura de instrução e a juíza Sofia Marinho Pires decidiu não pronunciar dois dos arguidos, que estavam acusados de um crime de ofensas à integridade física qualificada, na forma tentada, contra o então almirante Gouveia e Melo.