Vai em breve sair uma segunda edição de um livro que conta a história de um dos
álbuns mais importantes do Rock/ Pop irlandês, Astral Weeks, de Van Morrison. O
livro é Astral Weeks: A Secret History of 1968 e o autor é o músico e escritor Ryan
H. Walsh.
O curioso é que eu só verdadeiramente percebi a importância deste trabalho através
de Pemba, um monge nepalês que conheci em Hong Kong, na década de 90, numa
cerimónia curiosa: foi num “lançamento de peixes ao mar”, ao largo de HK,
cerimónia budista onde se devolvem à natureza seres vivos capturados. Nesse
barco estava um miúdo, de 12 ou 13 anos, no seu casaquinho vermelho bordado a
ouro, que tinha sido identificado como a reencarnação de um venerado lama budista
tibetano, quando tinha apenas dois anos, o espanhol Osel Hita Torres. Fechado num
mosteiro budista na Índia durante toda a infância, com a autorização dos pais
(apenas a mãe era budista) acabou por decidir, quase duas décadas depois,
abandonar seu “destino sagrado” e retornar ao seu país natal, onde vive
confortavelmente no litoral de Ibiza, como professor de uma escola primária.
Lembro que o Dalai Lama acabou de completar 90 anos, altura para dar início ao
complexo ritual para descoberta da sua reencarnação, que só se concretizará após
a sua morte.
No nosso grupo estava o meu filho Vasco, de idade próxima de Osel, o que veio
destabilizar a cerimónia! As duas crianças brincavam correndo pela pequena
traineira, perseguidos pelos monges que cuidavam do menino sagrado, puxando
com as mãos os longos hábitos para não tropeçarem, temendo que Osel se
aleijasse ou “fosse borda fora”. Outra cena curiosa foram as bênçãos dirigidas aos
crentes que embarcaram para receber graças do futuro Lama. Com ar enfadado e
traquinas, sentado numa espécie de trono na popa do barco, coberto por um grande
guarda-sol, o espanholito despachava-os com leves palmadas nas cabeças e “siga
a dança, a benção está feita”. Os risinhos amarelos e ternurentos por parte dos já
abençoados tornavam a cena ainda mais engraçada.
Ficámos amigos de um dos monges que cuidava do miúdo espanhol, que chegou a
vir a Macau fazer sessões de meditação budista. Era um monge modernaço,
pequenino, óculos escuros, mas muito simpático.
Em conversa referiu o disco Astral Weeks, que lhe tinha sido oferecido por um dos
vários freaks que em 1968 abundavam pelo Nepal. Ouvimos os temas num pequeno
gravador de cassetes, à noite, olhando as estrelas, numa praia de areia preta na ilha
de Coloane, em Macau.
Relatou experiências transcendentais e, quando mostrei o meu ceticismo, sorriu e
falou-me do monge Rinpoche, que, comprovadamente, levitou, isto é, elevou não só
a alma, mas também o corpo. A pessoa que levita espiritualmente teria alcançado
um estado tão elevado de consciência ou santidade que as leis físicas comuns
deixariam de se aplicar a ela momentaneamente.
Recitou um poema:
Fecha os olhos.
Sente o corpo dissolver-se gradualmente,
como névoa ao toque do sol da manhã.
Não há tempo.
Não há gravidade.
Sentes-te entre o mundo que conheces
e aquele que sempre pressentiste.
Estás a flutuar.
Ali mesmo ficou prometido experimentar uma sessão. Prometeu-me que com uma
técnica simples e natural de meditação, eu alcançaria o objetivo de levar a mente a
um estado de profundo repouso e silêncio, chamado de “consciência pura” ou
“transcendência”. Lembrou que foi popularizada pelo Maharishi Mahesh Yogi nos
anos 1950 e que se tornou amplamente conhecida no Ocidente, especialmente
após ter sido adotada por celebridades como os Beatles.
Combinámos uma sessão com mais gente, lembro-me de um professor que tinha
frequentado um seminário, meu colega na Universidade de Macau e que, mais
tarde, veio a acompanhar-me, com mais amigos, na viagem ao Tibete que gerou um
livro e um disco.
(Vou descrever o que ainda me lembro. Só espero que a especialista desta matéria
que colabora em ORegiões seja benevolente com a minha descrição… Continua)