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Mas quem anda a guardar cadáveres

É curioso como nos habituámos a viver num país onde a Polícia Judiciária, essa instituição que deveria ser o último bastião da justiça terrena, se especializou numa disciplina muito peculiar: a arte de não encontrar corpos. Uma incompetência tão consistente que já não pode ser obra do acaso. Há-de haver método.

Comecemos pela pequena Madeleine McCain, que hoje teria 22 anos. Desapareceu há quase duas décadas, num apartamento de férias que qualquer amador cobriria em quinze minutos com uma lanterna fraca. Terá, porventura, a menina sido abduzida por extraterrestres? Ou simplesmente evaporou-se como orvalho matinal ao sol do Algarve? A PJ não sabe, nem parece querer saber.

Depois temos o notável caso de Vale e Azevedo. Qualquer turista português em férias em Londres, entre uma visita à Torre e um chá nas docas, é capaz de o apontar na rua. “Olha, aquele ali é o Vale e Azevedo!” E depois telefona para o amigo, para o primo, para o vizinho. Todos sabem onde está o homem, menos a nossa polícia. É obra.

Agora, no caso da grávida da Murtosa, a história repete-se com um requinte kafkiano adicional: querem julgar um presumível homicídio sem o corpo. A família de Mónica Silva vai ao Tribunal da Relação do Porto pedir que o julgamento seja público, como último recurso para que alguém, em algum lado, talvez um espectador atento, diga: “Eu sei onde está o corpo! Vi-o noutro dia, junto à paragem do autocarro!”

De acordo com fontes sólidas como a minha avó e o taxista que me trouxe ontem a casa, esta incompetência policial não é fenómeno recente. Um estudo meticuloso revela que a última vez que a Judiciária falhou tão redondamente foi quando, ao quarto dia, foi investigar o desaparecimento de Jesus. O processo já leva mais de dois mil anos e nem sequer há um pedido formal de desculpas do director da PJ, Luís Neves. Vergonha nacional, digo eu.

O caso é tão sério que os americanos, sempre atentos à nossa soberania, já enviaram três séries da Netflix e um reality show para resolver o que a nossa polícia não consegue. É o equivalente contemporâneo às caravelas: eles chegam, exploram o território do crime, levam as especiarias das audiências e deixam-nos apenas com o ónus de explicar porque é que foram precisos estrangeiros para fazer o trabalho que era nosso.

Não querendo ser alarmista – embora seja precisamente isso que estou a fazer – receio que caminhemos para um país onde os criminosos podem agir à vontade, bastando esconder bem os corpos. Talvez estejamos a testemunhar uma nova forma de turismo: “Venha a Portugal, mate quem quiser, nós não encontramos os corpos!” Um slogan promissor para o Turismo de Portugal, que certamente atrairá uma nova leva de visitantes com malas estranhas e sorrisos ainda mais estranhos.

E o que dizer do actual director da PJ? Luís Neves dirige uma instituição que parece ter transformado a incompetência numa forma de arte, elevando o “não encontrar” à categoria de especialidade da casa. Se fosse um restaurante, teria uma estrela Michelin pelo prato “Ausência de Corpo com Molho de Impunidade” ou “Quando eu digo que este homem aqui ao lado é inocente, nem espero pela investigação”.

Resta-nos uma certeza sólida como a Torre dos Clérigos: enquanto continuarmos a confiar a investigação criminal a uma instituição que perde corpos como quem perde moedas no sofá, mais vale acendermos velas a Santa Catarina, padroeira dos casos perdidos. Ou talvez devêssemos simplesmente aceitar que há coisas que a PJ não consegue encontrar: corpos, chaves, leis decentes e um avião de droga em pleno voo.

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Joao Vasco Almeida
Joao Vasco Almeida
Jornalista 2554, autor de obras de ficção e humor, radialista, compositor, ‘blogger’,' vlogger' e produtor. Agricultor devido às sobreirinhas.

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