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Perdoa-lhes, Cristina, porque eles não sabem o que fazem!

Cristina Rodrigues é uma artista plástica e arquitecta portuguesa que faz parte de uma nova geração de talentos, cujo mérito é inquestionavelmente reconhecido em Portugal e no estrangeiro

Anoto com curiosidade e interesse o facto de Cristina Rodrigues, no âmbito da sua formação académica e artística, ter desenvolvido o seu projecto de pesquisa e centrado o seu trabalho de investigação no estudo e registo dos territórios portugueses com baixa densidade populacional.

Assinalo ainda o facto de Cristina Rodrigues utilizar essencialmente, nas suas criações e instalações, materiais populares e técnicas artesanais habitualmente associadas ao artesanato doméstico e tradicional português, fruto do seu gosto e interesse pela cultura tradicional e pelo seu ameaçado mas ainda genuíno universo imagético.

Tudo isto criou o ambiente e as condições para que Cristina Rodrigues decidisse aproximar-se da Beira Baixa, das suas tradições, das suas gentes, e da Alma do seu Povo. E foi justamente em Idanha, território que ainda hoje exerce sobre ela uma influência e um fascínio que a própria não consegue explicar, que decidiu nele assentar arraiais e estabelecer o seu projecto criativo. E de tal forma foi profícua essa simbiose, que esse período corresponde a um dos mais criativos da sua já longa carreira. E de tal forma Cristina Rodrigues soube interpretar o que de mais autêntico e verdadeiro ainda subsiste na cultura rural e popular raiana, que as suas obras eram apreciadas não apenas pelos públicos mais eruditos e familiarizados com a arte contemporânea e com a sua nem sempre evidente linguagem, mas também e sobretudo pelas gentes simples das aldeias, que visitavam as exposições e mostras onde Cristina Rodrigues valorizava objectos e técnicas que lhes eram tão familiares, como os adufes, as rendas, as fitas, e as cerâmicas tradicionais. E de tal forma o território se revia na arte de Cristina Rodrigues, que o próprio Município de Idanha-a-Nova a haveria de considerar sua embaixadora, depositando nela a confiança necessária para espalhar por esse mundo fora toda a riqueza e atractividade de Idanha-a-Nova. Porém, como Cristina Rodrigues não aceitasse contemporizar com certas e determinadas exigências e condições que o Município de Idanha-a-Nova lhe pretendia impor, porque contrariavam os seus princípios morais e éticos e limitavam a sua independência criativa, Cristina Rodrigues passou de bestial a besta em menos de um ápice. E daí à Autarquia pretender apropriar-se de peças que a artista tinha resguardadas em instalações municipais foi um passo, passo esse que se transformou num verdadeiro pesadelo, quando sete das suas mais belas criações daquele período foram totalmente inutilizadas e destruídas, a ponto de serem transformadas em verdadeiros cacos. Como é natural, Cristina Rodrigues fez valer os seus direitos autorais junto de um tribunal, e foi justamente um tribunal que reconheceu que, na impossibilidade de lhe serem entregues as suas criações, porque as mesmas não existiam mais, o Município deveria dar à artista o dinheiro correspondente ao valor das mesmas. Trata-se de uma soma considerável, é certo (agora agravada por juros, honorários e encargos com o processo), mas inteiramente correspondente à sua qualidade, ao seu valor plástico e  de mercado e, sobretudo, ao mérito e reconhecimento da sua autora. Ao invés de admitir o seu erro, e assumir a responsabilidade pelo perecimento das obras da artista, o Município de Idanha-a-Nova, na pessoa do Presidente da Câmara Municipal, Armindo Jacinto, decidiu agravar a disputa, recusando-se a executar a sentença emanada de um órgão de soberania, que condena o Município a pagar a Cristina Rodrigues determinada soma em dinheiro. Apesar de ser sujeita a todas esta sorte de malfeitorias e iniquidades, a verdade é que, ainda hoje, Cristina Rodrigues diz sentir por Idanha e pelos idanhenses o mesmo carinho e o mesmo encantamento de sempre, e isso percebe-se no brilho dos seus olhos quando o afirma. Isto, meus amigos, é generosidade, isto é grandeza de espírito. E por isso eu digo ( e penso que interpretando o sentimento de muitos idanhenses), perdoa-lhes, Cristina, porque eles não sabem o que fazem!

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PEDRO REGO

ADVOGADO E HISTORIADOR DE ARTE

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Pedro Rego
Pedro Rego
Advogado. Escreve artigos sobre diversas temáticas para o jornal ORegiões.

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