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Travar o ciclo de violência

Creio que a generalidade dos leitores estará de acordo que a sociedade está mais violenta ou que, pelo menos, essa é a perceção da maioria dos cidadãos. Como é óbvio, não me estou a referir apenas ao crime ou à violência física em geral, mas também à agressão e violência psicológica, incluindo a adulteração, falsificação, mentira manipulação, condicionamento e influência ilegítima de outrem, tanto da responsabilidade de executantes como de mandantes e inspiradores.

Esta violência é sistémica, no sentido de que uma leva a outra e impacta, de algum modo, no todo societal, minando a coesão social. Assim, a simples adoção de uma linguagem violenta pode levar ao desencadear de graves agressões físicas e criminosas, e não apenas a uma resposta (ainda que violenta) limitada ao plano da linguagem. De facto, violência gera violência e a forma como se expressa varia de indivíduo para indivíduo e de situação para situação.

As causas da violência residem, antes de mais, no indivíduo e na sua relação com os grupos sociais de pertença e referência, assim como na sociedade em geral. Os meios de comunicação, designadamente os mais poderosos – como a televisão e as redes sociais – “apenas” potenciam essas causas. Usá-los como bodes expiatórios, apenas serve para aliviar consciências e sacudir responsabilidades, não se ignorando, todavia, o papel que têm na exponenciação da violência.

Temos, todos, a noção de que as regras ou normas sociais – ainda que baseadas em meras convenções (por vezes mal compreendidas) – cumprem um papel decisivo na estruturação e funcionamento da sociedade, em particular no domínio da autoridade (parental, docente, laboral, institucional ou outra), a qual tem vindo a debilitar-se ou esboroar-se. Não sendo fácil, é imprescindível encontrar um equilíbrio útil e desejável entre libertinagem e autoritarismo (ou entre caos/anarquia e ordeirismo), aquilo a que genericamente se chama autoridade (ou ordem) democrática.

A exposição contínua à violência pode levar as vítimas a reproduzi-la, seja internalizando ideologias e práticas violentas, seja insensibilizando e despersonalizando, podendo ainda desenvolver transtornos mentais, como ansiedade, depressão ou stress pós-traumático. A violência episódica pode evoluir para surtos ou ciclos viciosos de violência, em que o sofrimento e o trauma são perpetuados geracionalmente ou intra/inter grupos sociais.

Uma sociedade com graves carências económicas e sociais – de “pão” (cesta básica), “paz” (segurança), habitação, saúde e educação, entre outras – onde prevalecem

ideologias e estruturas sociais que justificam e normalizam a violência, como a despersonalização, a exclusão social, a criação de “inimigos” imaginários e a justificação moral de atos violentos (recorrendo, por vezes, à instrumentalização da religião ou à invocação de um “patriotismo” bacoco), contribuem para a sua disseminação e perpetuação. Em sentido contrário, poderá (e deverá) falar-se de bondade, generosidade e ciclos virtuosos de solidariedade.

Cabe a todos, sem exceção, e muito especialmente aos líderes de opinião com maior poder de influência (sobretudo pelo exemplo, mas também pela palavra) – políticos, professores, músicos, atores, escritores e outros com projeção nacional e acesso aos média, mas também conceituadas e influentes personalidades locais – travar este surto de violência em Portugal e assumir, como desígnio cívico, a missão de reforçar os padrões éticos, as regras de conduta e os mais nobres valores sociais.

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José Nascimento
José Nascimento
Tem 68 anos e vive na aldeia de Vale de Zebrinho (Abrantes). Reformado do ensino superior, onde lecionou disciplinas de gestão e psicologia social, dedica o seu tempo à atividade cívica e autárquica. É, também, membro do núcleo executivo do CEHLA – Centro de Estudos de História Local de Abrantes (editor da Revista Zahara). Interessa-se pelas dinâmicas políticas e sociais locais e globais, designadamente pelos processos de participação e decisão democráticos.

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