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Proteção de Dados ou Proteção do Poder?

A sátira é um espelho que reflete a verdade, e o episódio recente em Castelo Branco é o retrato de um teatro tragicómico em pleno ato. Vamos aos factos: um órgão de comunicação social, novato no ofício e com mais vontade do que experiência, enviou um e-mail à câmara municipal a pedir para transmitir ao vivo as reuniões públicas. A resposta da câmara, através do seu departamento de comunicação, foi taxativa: “Não pode, por causa da proteção de dados”. E foi assim que o improvável espetáculo começou.

Os Bastidores do Desconhecimento

Por um lado, temos a comunicação social principiante, tropeçando nos bastidores da sua missão de informar. Por outro, uma câmara municipal que demonstra um grau preocupante de desconhecimento das leis que regulam a atividade jornalística. É que, ao contrário do que alega a câmara, jornalistas devidamente identificados e munidos de carteira profissional têm o direito de cobrir eventos públicos, como explicitamente esclarece a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC).

O argumento da proteção de dados, sacado às pressas como quem tenta apagar um fogo com um balde furado, não só é falacioso como contraditório. Como pode um órgão autárquico, que tem o dever de ser transparente, barricar-se atrás de uma interpretação errónea de legislação?

Proteção de Dados ou Proteção de Imagem?

É tentador especular sobre o verdadeiro motivo por detrás da decisão de proibir a transmissão. Será que a preocupação real é com os dados ou, na verdade, com a proteção da própria imagem da câmara? Afinal, há algo de inquietante na ideia de que as reuniões públicas, onde decisões que afetam todos os cidadãos são tomadas, sejam inacessíveis ao escrutínio direto.

Lamentavelmente, a ironia não termina aqui. A deliberação da ERC, número 162(DJ) de 2023, é cristalina: os jornalistas não estão sujeitos às supostas “orientações” da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) neste contexto. A lei protege a liberdade de imprensa e garante o acesso dos media às reuniões públicas. No entanto, a câmara parece ignorar este detalhe. Ignorância ou conveniência?

Leopoldo Rodrigues e a Falácia do Não Poder Proibir

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O presidente da câmara, Leopoldo Rodrigues, deveria saber que não pode proibir um jornalista de exercer a sua profissão, desde que devidamente identificado e credenciado. Aliás, até a figura jurídica mais insipiente compreenderia que as normas sobre proteção de dados não podem ser usadas como mordaça. Se o desconhecimento do presidente e do seu departamento de comunicação é genuíno, trata-se de uma falha grave. Se é intencional, é escandaloso.

Uma Lição para Todos

A saga, apesar de rocambolesca, oferece lições valiosas para todas as partes envolvidas. Para o órgão de comunicação social, a importância de estudar o terreno antes de entrar em campo e de entender os seus direitos e deveres. Para a câmara, a necessidade urgente de se educar sobre as leis que regem a transparência e a liberdade de imprensa. E para os cidadãos de Castelo Branco, a evidência clara de que devem estar vigilantes e exigir responsabilidade dos seus representantes.

No fim, a sátira é amarga, mas necessária: proteção de dados, sim; proteção de decisões públicas, nunca. Que a comédia se transforme em lição e não em tragédia.

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Fernando Jesus Pires
Fernando Jesus Pireshttps://oregioes.pt/fotojornalista-fernando-pires-jesus/
Jornalista há 35 anos, trabalhou como enviado especial em Macau, República Popular da China, Tailândia, Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Paralelo 38, Espanha, Andorra, França, Marrocos, Argélia, Sahara e Mauritânia.

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