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O Primeiro-Ministro, empresa e a amante dela

Imaginem-se numa repartição pública onde o ar condicionado está avariado desde o Euro 2004. Há um homem a segurar um talão 127 escrito em letras góticas, uma senhora a debater-se com um selfie stick para fotografar um formulário, e um funcionário que parece ter sido treinado pela Siri para responder “O sistema está em baixo” em 17 dialetos. Eis o verdadeiro Ensaio sobre a Cegueira português: uma coreografia burocrática que faz os filmes da Marvel parecerem um conto de fadas linear. Enquanto espero, pondero: será que o Montenegro também enfrentou esta fila para vender quotas à mulher? Ou usou o FastPass dos connected people?

O caso Montenegro vs. Código Civil é o novo “Succession” tuga. Só falta o tema de abertura ser tocado por uma guitarra portuguesa. Enquanto discutimos se a venda de quotas é mais ilegal do que estacionar em cima do passeio, esquecemos o essencial: a corrupção não é um spoiler de novela da TVI. É um remake permanente, com elenco rotativo e plot twists pré-aprovados pelo Tribunal Constitucional. Lembram-se daquela cena em The Truman Show onde todos fingem normalidade? Pois. Aqui, o mar é de despachos ministeriais, e o barco chama-se Tugalândia.

Os debates na Assembleia da República lembram-me um episódio de The Office realizado por Wim Wenders. Há personagens que falam em loop (“Transparência! Ética!”), outros que encenam dramas shakespearianos ao estilo Morangos com Açúcar, e um background de funcionários a preencher requerimentos como se estivessem a decifrar hieróglifos. Enquanto isso, o país pergunta: “Quem é que realmente controla o Dunder Mifflin Scranton da Tuga?” A resposta, claro, está num post-it perdido na gaveta do Costa.

Sim, o país está a arder. Literalmente (obrigada, alterações climáticas) e metaforicamente (olá, inflação). Mas temos sardinhas no pão, streaming de bacalhau gourmet no Instagram, e a certeza de que, enquanto houver merchandising do Benfica, ninguém notará os buracos na estrada. A cultura portuguesa contemporânea é isto: um mashup de fado, memes do Zeinal e a nostalgia dos Telejornais dos anos 90, onde o pior que podia acontecer era o Fernando Mendes esquecer o texto.

Quanto ao Montenegro e à empresa-girafa do Jardim Zoológico? Deixemos a Justiça decidir. Ou, se preferirem, apostem no Euromilhões. As probabilidades são as mesmas.

P.S. Enquanto escrevia isto, o meu vizinho do 3º esquerda gritou “O Benfica vai ganhar a Champions!”. Sorri, acenei, e pensei: Somos mesmo tão modernos quanto a nossa capacidade de acreditar em finais felizes. E em contratos de compra e venda assinados com lágrimas de emoji.

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Joao Vasco Almeida
Joao Vasco Almeida
Jornalista 2554, autor de obras de ficção e humor, radialista, compositor, ‘blogger’,' vlogger' e produtor. Agricultor devido às sobreirinhas.

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