Por entre as águas profundas dos oceanos, estende-se uma rede invisível que sustenta praticamente tudo o que fazemos no mundo digital. Poucos sabem, mas 99% do tráfego global de dados circula por cabos submarinos, e não por satélites como geralmente se imagina. Esta infraestrutura, composta por milhares de quilómetros de cabos de fibra óptica, é discreta mas absolutamente vital.
No entanto, essa mesma invisibilidade tornou-a um alvo fácil — e silencioso. Nos últimos dois anos, múltiplos cabos submarinos foram danificados em pontos estratégicos, especialmente no Mar Báltico e no Mar do Norte. Inicialmente tratados como acidentes, os episódios passaram a ser analisados como possíveis atos de sabotagem. E todas as pistas apontam numa direção: Rússia.
A NATO elevou o nível de alerta. O aumento das patrulhas navais e a monitorização de embarcações russas, nomeadamente do navio Yanter, sugerem uma preocupação crescente. Este navio, dotado de capacidades avançadas para operar nas profundezas, tem sido avistado com frequência nas proximidades dos cabos afetados. O seu histórico inclui mapeamentos e atividades que sugerem reconhecimento prévio de infraestruturas sensíveis. Coincidência? Pouco provável.
Os cabos submarinos são, hoje, muito mais do que canais de comunicação. Por eles fluem operações financeiras, comunicações diplomáticas, ordens militares e dados vitais para sistemas energéticos. A sua importância estratégica é comparável à de oleodutos ou centrais elétricas. E, no entanto, continuam vulneráveis, tanto a fenómenos naturais como a ações humanas. Mas quando se trata de uma sabotagem intencional, as implicações sobem de escala — e de gravidade.
O que está em causa não é um simples corte de ligação à internet. Trata-se da possibilidade real de um colapso digital coordenado. Um apagão que afete não só o quotidiano das pessoas, mas também a estabilidade económica, a segurança nacional e a soberania digital dos países. E se tal ataque partir de uma potência como a Rússia, já envolvida em múltiplas frentes híbridas de confronto, o cenário torna-se ainda mais preocupante.
Neste contexto, a comunidade internacional deve reagir com firmeza e visão estratégica. A proteção das infraestruturas submarinas tem de passar a ser uma prioridade absoluta. Reforçar a vigilância, garantir redundâncias e promover uma cooperação sólida entre estados, forças armadas e operadores privados são passos urgentes.
A próxima guerra pode não começar com tanques ou mísseis. Pode começar no fundo do mar, com o corte silencioso de um cabo que liga continentes. E quando isso acontecer — se nada for feito até lá — será tarde para remediar.
Precisamos de agir antes de mergulharmos no silêncio digital. Porque sem essa rede invisível, o mundo simplesmente para.