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A leitura do tempo político

Porque é que o “25 de Abril” foi em abril, no dia 25 e em 1974? E porque é que foi realizado por militares (aqueles militares) – envolvidos diretamente numa guerra pela disputa de territórios colonizados – com maiores ou menores ligações a organizações ou movimentos políticos e à sociedade civil (com as suas estruturas familiares, profissionais, etc.)? Há uma realidade específica em cada momento do tempo político – sendo este também um tempo social, económico, cultural, geoestratégico, etc. – determinada por fatores diversos, uns previsíveis, controláveis e dependentes da nossa vontade, outros não.

Pergunto, então, para estimular a reflexão sobre a leitura do tempo político – sua compreensão, escolha e eficácia na ação de natureza ou (com) projeção política – porque é que o “25 de Abril” não foi antes, p.e. em 16 de março de 1974 quando se deu o Levantamento ou Golpe das Caldas, posteriormente à publicação da versão francesa do livro de Mário Soares “Portugal Amordaçado” (abril de 1972) e do livro de António de Spínola “Portugal e o Futuro” (fevereiro de 1974)?

Ou porque é que não foi depois, p.e. em 28 de setembro de 1974 (Manifestação da “Maioria Silenciosa”), em 25 de novembro do ano seguinte (termo do PREC e afirmação da Democracia Liberal) ou aquando da democratização de Espanha (Transição Espanhola, 1975-1978)? Todos estes acontecimentos, obviamente interligados, tiveram lugar no decorrer de uma fita do tempo, i.e. de um processo histórico que foi amadurecendo, resultando – ou contribuindo – para aquilo que, na época, correntemente se designava por “criação (ou existência) de condições [materiais] objetivas”.

É comum falar-se em “ter razão antes do tempo”, seja para meramente o constatar, seja para negar a sua utilidade. Discordo desta última asserção, acho mesmo que se deve ter razão tão cedo ou antecipadamente quanto possível. A isso chama-se “visão” e é essencial em estratégia, política ou outra. Coisa diferente é o que fazer com essa razão precoce, de que é exemplo o Golpe das Caldas, o qual esteve para ser – se não falhasse – o “25 de Abril”. E, tal como este beneficiou do 16 de Março, também a concretização do “ter razão antes do tempo” pode contribuir para que esse tempo acelere e a razão crie o seu momento.

Em política (e não só), a leitura do tempo e a escolha do melhor momento para agir – e como agir (o quê, quanto, onde, quem) – são essenciais. Nem todos temos a melhor capacidade de leitura do tempo e, tendo-a, guardá-la com frieza – sem ansiedades nem precipitações – gerindo bem as emoções. Ao fazê-lo potenciamos a probabilidade de sucesso, ao ignorá-lo ou errá-lo perdemos essa oportunidade e, frequentemente,

deitamos tudo a perder. Sim, o Golpe das Caldas poderia ter sido o falhanço prematuro do “25 de Abril” (ainda hoje se questiona por que não foi), mas, como aponta o “advogado do diabo”, também pode ter sido a razão do seu sucesso.

É a vida, com os seus paradoxos e contradições, metade determinista metade voluntarista. Ou, como canta Susana Félix, “O tempo, esse bandido clandestino / Salteador de estradas e memórias / Mistura numa névoa libertino / O passado e o futuro das histórias. / O tempo de dizer a vida é breve / O tempo de viver há quem o diga / Só espera que o diabo que o leve / O tempo tem mais olhos que barriga”. É preciso aprender a conhecer, dominar e gerir o tempo com proveito próprio porque o tempo pode, de facto, ser o nosso melhor amigo ou o nosso pior inimigo.

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José Nascimento
José Nascimento
Tem 68 anos e vive na aldeia de Vale de Zebrinho (Abrantes). Reformado do ensino superior, onde lecionou disciplinas de gestão e psicologia social, dedica o seu tempo à atividade cívica e autárquica. É, também, membro do núcleo executivo do CEHLA – Centro de Estudos de História Local de Abrantes (editor da Revista Zahara). Interessa-se pelas dinâmicas políticas e sociais locais e globais, designadamente pelos processos de participação e decisão democráticos.

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