Já à saída da vila, parei o carro num restaurante à beira da estrada para tomar um café. Cá fora, sentado na esplanada, solitário, um rapaz da minha idade folheava, distraído, o Correio da Manhã.
Viva, como vai? – “Ora, cá vamos indo… e o Carlos?” Também, resistindo, como sempre… De repente, ao deparar com a beleza marmórea de uma diva a corpo inteiro ali estampada nas páginas finais do jornal, o meu interlocutor sorri com malícia, aponta com um gesto aquela Eva provocante e exclama, meio nostálgico: “Eh, Carlos, que saudades, que saudades…”.

Colhido de surpresa pela confissão, numa daquelas sinapses de que só o cérebro sabe o segredo, lembrei-me de um conto de Aquilino – Quando ao Gavião cai a pena… Diálogo nostálgico de um par que, preso, quando jovem, nas teias das conveniências e das convenções sociais, não teve, na primavera da vida, a coragem do amor no devido tempo, sofrendo agora, no outono, a amargura de uma felicidade possível que esteve ao seu alcance, mas irremediavelmente lhe escapou.
Logo de seguida, lembrei-me do meu avô, que, já a caminho dos 80, depois da morte da minha avó, ainda namorou uma vizinha, longe, como ele, dos verdes anos, garantindo as más línguas que o viram várias vezes entrar à socapa, já noite cerrada, em casa dela.
Na esplanada, o rapaz da minha idade continuava parado naquela página do jornal e repetia, agora quase em surdina: “Tenho tantas saudades, tantas saudades…”.
Enfim, cada um sabe de si e Deus sabe de todos.