Os debates televisivos para as legislativas antecipadas de 18 de maio arrancaram esta segunda-feira com os primeiros frente a frente entre os líderes da AD e do PCP, na TVI, e entre Chega e PAN, na RTP-3. Luís Montenegro, pela AD, e Paulo Raimundo, pela CDU, deram o pontapé de saída para os debates da temporada 2025 para as legislativas de 18 de maio. Debateram questões éticas, impostos, saúde e defesa. Já o confronto entre Inês Sousa Real, do PAN, e André Ventura, do Chega, seguiu o mesmo guião político dos últimos anos. Ou seja, apesar do debate tenso com ambos a discordarem a trocarem acusações sobre criminalidade, sobretudo criminalidade sexual e imigração, parece que ambos “engoliram uma cassete” e repetem sempre os mesmos argumentos
A grande surpresa da primeira noite dos debates televisivos foi a postura do líder comunista, que melhorou em relação aos debates de 2024, que o apanharam ainda muito em início de funções. Montenegro ficou surpreendido com a assertividade de Paulo Raimundo.
Um dos momentos mais constrangedores para Montenegro foi, logo no início do debate, quando o líder do PCP insistiu que o primeiro-ministro “teria dado um contributo maior se se tivesse demitido”, mas Montenegro recusa.
“Mesmo do ponto de vista ético, não há nada a apontar, cumpri todas as minhas funções. Não escondi nada. A situação é conhecida porque a dei a conhecer”, responde o primeiro-ministro em gestão, garantindo que está disponível para prestar esclarecimentos.
Paulo Raimundo conseguiu encurralar o líder do PSD, quando pediu a Montenegro que deixasse a vitimização de lado e atacou: “Temos um Governo que se caracteriza pela propaganda.” Em caso de reeleição, o líder do PCP diz que “demissão” ainda fica mais evidente.
“Continuarei a responder aquilo que for necessário. (…) Não posso ser responsabilizado por aquilo que não faço. Também posso reclamar que as pessoas percebam o contexto, (…) nunca houve nenhuma contaminação. Não há ninguém que me possa apontar isso”, replicou Montenegro.
O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, foi o primeiro líder político a defrontar Luís Montenegro (numa maratona de debates onde o tema da ‘Spinumviva’, a empresa familiar do primeiro-ministro, vai ser incontornável), impediu Montenegro de pôr o PCP no mesmo saco do PS, disse que, com ele, não valia a pena gastar latim com a “estratégia de vitimização”.
Luís Montenegro ensaiou com Raimundo aquilo que, provavelmente, vai andar a repetir durante as próximas semanas em todos os debates em que vai participar: “Cumpri todas as minhas obrigações declarativas”, “não escondi nada”, “não há incompatibilidade”, “não tomei nenhuma decisão em conflito de interesses” e “não tive nenhum benefício em função da atividade privada”.
Se o primeiro tema, a ética, podia ser desvantajoso para Montenegro, o último tema, a política de Defesa, podia ser mais complicado para Paulo Raimundo. À pergunta sobre se o Estado deve investir recursos públicos na guerra, o secretário-geral comunista foi perentório: “Não, a guerra não é nenhuma necessidade do país. Não precisamos de construir armas nem bombas, precisamos de produzir alimentos, medicamentos, comboios…”. Mais: “As Forças Armadas precisam de ser equipadas para cumprir desígnio constitucional, mas dinheiro para a guerra? Zero”.
Se Raimundo diz que não troca políticas de saúde e segurança social por armas, Luís Montenegro também alinhou: “Não trocamos as políticas sociais por investimento em Defesa – as duas são cumulativas”, assegurou, defendendo os direitos e liberdades da Ucrânia e dizendo que é disso que se trata quando se trata de ajudar um país atacado por outro. “Estamos a apoiar direitos”. Mas Raimundo não se sensibilizou: o PCP não dá um cêntimo para “a guerra”.
Os “chefes” de família
Como era esperado, Paulo Raimundo não deixou “passar em claro” a acção de ‘marketing’ que decorreu na semana passada com o Conselho de Ministros montado em pleno mercado do Bolhão, no Porto, atacou a emblemática medida da AD de reduzir o IRC às empresas em 2 pontos percentuais ao ano. “A descida do IRC pagava em quatro anos uma rede pública de creches”, disse, numa alusão à falta de vagas e à carência neste setor que Montenegro não contrariou. “O Luís Montenegro é pai, eu também sou pai”, salientou.
Montenegro contra-atacou e salientou que baixar o IRC às empresas é um caminho para libertar liquidez para essas mesmas empresas serem mais competitivas e, em função disso, pagarem melhores salários. Para Raimundo, contudo, uma grande empresa pagar 18,5% de impostos, “igual ao que cada um de nós paga”, não faz “qualquer sentido”. Foi aqui que Montenegro tentou comparar o PCP ao PS, porque ambos partilhavam a visão em relação a não baixar o IRC para as empresas, mas Raimundo pôs um travão: “Não traga para aqui o PS, não lhe fica bem, terá oportunidade de debater com o PS.”
Depois da comparação do IRC com a rede pública de creches, Raimundo voltou a insistir na imagem da paternidade (“eu sou pai, o Luís Montenegro também é pai”), que serviu para criticar o estado do SNS: “Este fim de semana tivemos 7 urgências pediátricas fechadas, é tolerável isto continuar assim?”, afirmou. Para Paulo Raimundo, o problema do SNS resolve-se com mais profissionais. A receita, diz, é esta: dignificar as carreiras, valorizar os salários, criar condições para ir buscar os profissionais de saúde ao privado e para os fixar no público. “Ou se fixam os profissionais, ou vamos continuar a transferir recursos públicos para fazer negócios”, disse.
À crítica sobre a promessa não cumprida de atribuir um médico de família a cada utente, Montenegro admitiu a falha – ainda que o motivo da falha tenha sido o facto de ter havido um aumento dos “utentes”. Ou seja, aumentaram as pessoas, aumentou a necessidade de ter mais médicos capazes de dar resposta. A promessa, disse Luís Montenegro, vai-se manter, prometendo o “redobrar o esforço” para a cumprir.
Na saúde, Montenegro defendeu a gestão público-privada no sentido de conseguir “maior agilidade e melhores resultados dentro do SNS” em locais onde é mais preciso, pondo o foco no utente. “O serviço público que prestamos é a quem, ao cidadão ou ao Estado? Quem é que queremos ajudar, a pessoa ou a visão ideológica?”, atirou.
Quanto ao resto, Montenegro focou-se em elencar as várias medidas de apoio aos vários setores da sociedade, dos jovens aos idosos, passando pelas 17 carreiras da administração pública, recorrendo a uma provocação: “Com tudo o que fizemos, é cada vez mais difícil até para um comunista não votar na AD”, disse, naquilo que resume toda a estratégia de Montenegro para estas eleições: confiar que o reforço de rendimentos e apoios dados aos jovens, idosos e funcionário públicos, o vai fazer ganhar a eleição.
A cassete do costume
Passemos ao segundo debate: André Ventura versus Inês Sousa Real. Ambos engoliram uma cassete e repetiram os argumentos, já gastos, que tem utilizado nos últimos anos. Ambos tentaram puxar para si “grandes vitórias” parlamentares.
Inês Sousa Real apresentou-se como a única parlamentar que trabalha “a sério” na A.R., ao que André Ventura contra-argumentou com a “vida real dos portugueses”, que pagam os combustíveis mais caros da Europa.
Mas vamos ao princípio de debate, que também ficou marcado pela postura mais calma e menos truculenta de André Ventura. O líder do Chega começou o debate acusando o PAN e a esquerda de impedirem o aumento de penas para violações e para a expulsão de imigrantes que comentam crimes. Na resposta, Inês Sousa Real acusou Ventura de “desvalorizava a pedofilia” e de agora voltar a “ter um discurso propagandístico”.
Na primeira parte, Ventura focou-se nestas propostas dizendo que o país está “uma bandalheira” e acusou o PAN de ser “muleta do PS e do PSD” em vários dossier o que levou Sousa-Real a responder: “Quem andava de joelhos a pedir para fazer parte do governo da AD era o Ventura”.
Na parte final, Ventura aproveitou para pedir explicações a Montenegro dizendo que o primeiro-ministro “insiste em manter-se à margem” e que existem suspeitas sobre ele, nomeadamente comprar casas a pronto e ter várias contas bancárias abaixo do limite para não as declarar: “Ou é rico e não é mau ou enriqueceu de forma suspeita”.
Haverá acordo com Montenegro? “Enquanto não houver clareza e transparência nunca será nunca”, deixando a porta entreaberta para eventuais acordos com o PSD caso Montenegro dê as explicações que o Chega considere suficientes.
Durante a sua intervenção, Inês Sousa Real acusou o Chega de “mentir” e de andar de “joelhos” para fazer parte do Governo de Montenegro.
A acusação surgiu depois da deputada do PAN falar sobre uma falsa percepção de insegurança em Portugal e, em resposta, André Ventura mostrou-se a favor da castração de pedófilos: “Um violador deve ir para a cadeia, um pedófilo deve ser castrado.”
O PAN quer “compromisso” para o próximo Governo e aponta medidas contra violência, alterações climáticas e proteção dos animais, defendeu Inês Sousa Real.
O PAN acusou o Chega de contribuir para um ambiente de bullying e falta de respeito no Parlamento. “E nunca ouvi uma desculpa”, atira Inês Sousa Real.
André Ventura desvaloriza a acusação, considerando que também é alvo de ofensas na Assembleia da República, e retoma o debate para o tema da proteção de animais. Ainda sobre a corrupção, o líder do Chega aproveitou para dizer que o PAN “sustentou a corrupção de Miguel Albuquerque da Madeira”.
Falando de um ‘não tema’ como é o caso das touradas, num momento em que as pessoas estão preocupadas com o que se passa no Mundo, Inês Sousa Real demonstrou desconhecer a realidade. Situação que foi aproveitada por Ventura: “não gosta mais de animais do que eu, mas podemos discutir a proteção animal. Sabe quantos touros morrem em Portugal? São cerca de 300. Mas milhões em abate religioso. (…) O Chega tentou proibir e o PAN estava do outro lado da barricada. (…) Algumas comunidades, como a cigana, tratam cavalos e outros animais de forma absolutamente cruel”.
Inês Sousa Real responde – “é mentira” – e insiste que o partido de André Ventura permite o financiamento para a tortura animal (touradas) afirmando que existem autarquias que financiam com milhões esse espetáculo. O que já foi por diversas vezes desmentido, mas Inês Sousa Real, assim como André Ventura, são daquelas pessoas que considera que uma mentira repetida várias vezes passa a ser verdade…