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O Rosto da Hipocrisia: O Gestualismo Político e as Voltas que a Vida Dá

A vida, meus caros, tem esta maravilhosa capacidade de nos surpreender a cada esquina, qual boa comédia de teatro que nunca perde a graça. Quando pensamos que já vimos tudo, surge mais uma peripécia que nos faz questionar se o que está em cena é mesmo a política ou um improviso de última hora. Neste caso, a peça que se desenrola na Assembleia da República (AR) envolve dois protagonistas cujos gestos, embora aparentemente inocentes, carregam todo o peso da história e do simbolismo. Falamos de Rui Tavares e Miguel Arruda, dois vultos da política nacional, cujas atuações nos oferecem o melhor da sátira política, entre o absurdo e o impensável

O Rosto da Hipocrisia: O Gestualismo Político e as Voltas que a Vida Dá
Fotomontagem: ORegiões

Comecemos com o nosso herói, Rui Tavares, líder do Livre, que, em um gesto de grande fervor democrático, decide interpelar a mesa da Assembleia sobre uma questão urgente: a saudação nazi feita por Miguel Arruda, ex-deputado do Chega, durante uma votação. E aqui, a tragédia começa: Arruda, que se encontra agora em pleno limbo parlamentar, depois de abandonar o partido e se ver envolvido em acusações de furto de malas (não, não é piada), protagoniza uma cena digna de uma tragédia grega. Rui Tavares, sempre atento à moralidade política, aponta o dedo: o gesto de Arruda é, segundo ele, claro como água – uma mão levantada, estilo César, com todos os ecos sombrios de um regime do qual seria mais fácil esquecer a existência, não fosse por gestos como este.

Agora, e aqui está o verdadeiro molho da história: Rui Tavares, esse amante da história e defensor dos valores democráticos, já terá feito também esse mesmo gesto em tempos passados, mas claro, ele mesmo o desmente. Afinal, quem nunca fez uma saudação romana, ou nazi,  em pleno Parlamento para assinalar o seu voto? Todos sabemos que isso é algo completamente normal, não é? Como quem diz “bom dia”, mas com os braços levantados, como se se estivesse a invocar uma lenda antiga de Roma, ou talvez o espírito de César em pessoa.

Mas a verdadeira ironia chega quando Arruda, num esforço por salvar a sua dignidade política, desmente a acusação com a suavidade de um político experiente, alegando que o gesto não passava de uma simples forma de indicar o seu voto, como tantos outros fazem – e, veja-se bem, até os deputados de esquerda. Claro, claro. Quem nunca esticou o braço e se fez notar no meio de uma votação como um novo César em busca de notoriedade? Pois, talvez, a política portuguesa seja realmente um campo fértil para a inovação, até no que toca a expressões corporais.

E quem diria que Marcos Perestrello, o vice-presidente do parlamento, se veria na posição de ter de intervir? Ele, o guardião dos gestos parlamentares, declara que não viu o tal gesto e, se este de facto aconteceu, deveria ser “condenável”. E como o teatro é uma arte cheia de improviso, começa então uma troca de palavras entre Arruda e Perestrello, onde o deputado em questão insiste que tal gesto é comum, é “usado por muitos”, até por aqueles de esquerda – a quem a crítica também não foge, parece.

E aqui, meus amigos, temos o verdadeiro ponto de reflexão. O que esta troca de acusações e negações nos ensina não é apenas sobre gestos mal interpretados ou simbologias perigosas. Não, o que nos revela é a profunda hipocrisia que permeia os bastidores da nossa política. Afinal, quem se importa com os gestos, quando o que realmente importa são as ações que os acompanham? É certo que a crítica a Arruda pode ser legítima, mas ela também traz consigo o peso de uma moralidade seletiva, onde todos, mais tarde ou mais cedo, parecem ser acusados daquilo que antes criticaram com tanto fervor.

Afinal, como diz o ditado: “Diz o roto para o nu”, e, neste caso, todos parecem ter algo a esconder. Não seria este um episódio perfeito para nos lembrar de que, por mais que queiramos acusar os outros dos erros do passado, a vida, com a sua sagacidade, acaba sempre por dar as voltas certas, e todos acabam por tropeçar nos mesmos buracos que antes apontavam com tanto desdém?

Quem se arrisca a garantir que, no futuro, o próprio Rui Tavares, ou qualquer outro político de moral irrepreensível, não se verá em apuros por algo semelhante? Quem poderá dizer que os gestos e os símbolos que hoje condenam não terão, um dia, outro significado? Talvez, mais do que a guerra contra os gestos perigosos, a verdadeira luta seja contra a hipocrisia que alimenta este nosso sistema político.

Como a vida e a política nos mostram, no final das contas, todos parecem andar em círculos – e quem criticava ontem, poderá ser o alvo das críticas amanhã. Pois, de uma coisa podemos estar certos: as voltas que a vida dá, nem sempre nos fazem ver a verdade que está à nossa frente.

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Fernando Jesus Pires
Fernando Jesus Pireshttps://oregioes.pt/fotojornalista-fernando-pires-jesus/
Jornalista há 35 anos, trabalhou como enviado especial em Macau, República Popular da China, Tailândia, Taiwan, Hong Kong, Coréia do Sul e Paralelo 38, Espanha, Andorra, França, Marrocos, Argélia, Sahara e Mauritânia.

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