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A memória é longa

É habitual dizer-se que “a memória é curta” e, de facto, por natureza é. Mas os seres humanos há muito que criaram auxiliares de memória que estendem esta nossa fantástica – mas naturalmente limitada e seletiva – capacidade cognitiva (um parênteses para fazer notar que o mesmo se passa com a atenção e a compreensão). Podemos hoje dizer, por isso, que “a memória é longa”.

Existem, atualmente, extensores de memória com uma capacidade ainda há poucos anos inimaginável. O meio mais conhecido para lhes aceder será, porventura, o Google ou outro motor de busca, para além do uso que fazemos da memória digital dos nossos computadores e smartphones, ou da memória analógica dos suportes em papel ou outro material gravável.

A passagem de uma “memória curta” para uma “memória longa” alterou, substancialmente, o paradigma competitivo e argumentativo na política. É hoje possível recuperar ‘online’ muito do que foi dito e feito nos últimos 20 anos (pelo menos), assim como muita informação histórica que foi digitalizada em bases de dados diversas.

Por outro lado, a extensão da memória aumentou também no espaço, para além do tempo. Muito do que foi dito e feito noutros lugares mais ou menos longínquos, está registado e pode ser igualmente pesquisado e consultado, possibilitando um exercício comparativo de “benchmarking” que relativiza (para melhor ou para pior) a prestação de entidades comparáveis.

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Tal como existem “más memórias” no domínio cognitivo ou da mente, algumas geradoras de grande sofrimento, também no domínio digital há registos que se pretende apagar, porque comprometedores da personalidade, caráter ou reputação dos seus autores, designadamente nos meios profissional, social e político, entre outros.

Sendo certo que todos têm o direito – a até o dever – de evoluir e melhorar o seu ser e o seu desempenho, a informação que se pode recuperar no espaço virtual ou digital ajuda muito a compreender e explicar – e até a confrontar e responsabilizar – aquilo que é dito ou feito no presente, relativamente ao passado ou a outros espaços e entidades.

Evidentemente que a “memória longa”, apanágio dos tempos que vivemos, pode ser politicamente utilizada pelo poder e pelas oposições. Isso, em si mesmo, não constitui nenhum problema, desde que seja utilizada com rigor e verdade. O rigor e a verdade

que a ética exige e a “expetativa normativa” impõe, ou seja, aquilo que os valores e princípios orientam e aquilo que se pode e deve razoavelmente esperar.

Uma palavra final para as atas e gravações das reuniões. Constituem, também, registos úteis para o trabalho político do poder e das oposições, tendo as primeiras perdido alguma utilidade – até porque são frequentemente mal elaboradas – a favor das gravações vídeo (geralmente de transmissões online em direto), estas completas e bastante rigorosas.

Tal como das atas podem ser feitas citações, também das gravações é legítimo cortar as passagens que interessam, obviamente sem descontextualizar umas ou outras (a tal dimensão ética antes referida). Mas atenção, contextualizar não significa necessariamente publicar integralmente determinadas declarações, mas apenas aquelas que permitam interpretar corretamente as passagens cortadas ou citadas.

Este é, pois, um tempo em que só tem “memória curta” quem não quiser ou não souber pesquisar, à distância de um dedo, a informação de que necessita para recordar (ou conhecer) muito do que se passou (ou passa) em qualquer território. Informação essa que permite relacionar e interpretar a evolução e interação dos fenómenos políticos, proporcionando um entendimento mais fidedigno da realidade.

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José Nascimento
José Nascimento
Tem 68 anos e vive na aldeia de Vale de Zebrinho (Abrantes). Reformado do ensino superior, onde lecionou disciplinas de gestão e psicologia social, dedica o seu tempo à atividade cívica e autárquica. É, também, membro do núcleo executivo do CEHLA – Centro de Estudos de História Local de Abrantes (editor da Revista Zahara). Interessa-se pelas dinâmicas políticas e sociais locais e globais, designadamente pelos processos de participação e decisão democráticos.

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