A mobilidade entre os municípios da Beira Interior pode ajudar a combater as assimetrias em Portugal, onde existe um país “a duas velocidades”, com o litoral, onde se concentra 80% da população, e o interior, onde existe pouca oferta e os transportes públicos nem sempre são compatíveis com as necessidades da população.
A Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT) quer alargar o modelo de mobilidade integrada a 23 municípios da Beira Interior, com a criação de um passe único e um comboio expresso entre Castelo Branco e Guarda, conforme anunciou esta entidade, em Lisboa, na apresentação do estudo “Combate à Pobreza da Mobilidade”, no âmbito do projeto-piloto de Mobilidade Integrada na Beira Interior.
Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT) pretende que seja criado um comboio expresso entre Castelo Branco e a Guarda e se substitua as dezenas de títulos de transporte neste eixo por um “passe” mensal e um bilhete únicos, físicos ou adquiridos através do telemóvel ou cartão bancário.
Esta solução permitiria deslocalizar para a Beira Baixa e Beira Alta um modelo similar ao da Carris Metropolitana, criada para a Área Metropolitana de Lisboa. O estudo de mobilidade apresentado pela AMT aponta ainda ao desenho de uma plataforma digital para consulta de percursos nos vários municípios, à imagem do que vemos igualmente na Carris Metropolitana, e por integração em aplicações como o Google Maps.
Deste modo, um habitante de uma aldeia de Belmonte poderá saber exatamente que transportes deve apanhar para chegar ao centro da Guarda, a uma aldeia de Castelo Branco, ou a outro ponto qualquer do território.
O serviço ferroviário proposto entre Castelo Branco e a Guarda, numa distância de cerca de 100 quilómetros, deverá ter frequências de hora a hora em ambos os sentidos e ser efetuado sempre ao mesmo minuto dessas horas, contando com apenas cinco paragens no total do percurso, nas sedes dos municípios atravessados, aproveitando a eletrificação total da Linha da Beira Baixa.
A viagem entre as duas capitais de distrito poderá ser feita em 87 minutos, contra os 100 minutos atualmente despendidos em autocarro.
A recomendação para criação do comboio regional expresso está presente no estudo “Combate à Pobreza da Mobilidade”, conceito ligado a rendimentos baixos, elevadas despesas com combustíveis ou a falta de transportes privados ou públicos acessíveis ou a preços comportáveis. O documento teve apresentação nesta terça-feira, em Lisboa, no âmbito do Projeto-piloto de Mobilidade Integrada na Beira Interior.
Além de Belmonte, Castelo Branco, Covilhã, Fundão e Guarda, a AMT recomenda o alargamento da articulação de mobilidade às duas comunidades intermunicipais (CIM), a das Beiras e Serra da Estrela e da Beira Baixa, às quais é sugerida a criação de uma autoridade de transportes única.
No evento da AMT, que juntou a apresentação do estudo sobre pobreza de mobilidade e a revelação do primeiro relatório do projeto de Mobilidade Integrado da Beira Interior, Susana Baptista considerou que “o sistema de mobilidade integrada não deverá estar limitado aos cinco municípios” e “a articulação deve estender-se às duas CIM que compõem o território da Beira Interior. O facto de existirem já duas redes de transportes públicos que estão em processo de finalização da contratação pelas respetivas CIM são um passo importante para uma cobertura territorial mais uniforme.
Ao contrário do trabalho a desenvolver a nível rodoviário, a solução ferroviária está dependente da ação do Estado central e da CP, nota Susana Baptista. Para contornar os constrangimentos da CP com material circulante, uma possível solução, pouco ortodoxa, será a aquisição de composições pelos municípios, recorrendo a fundos comunitários, desafiou o vice-presidente da câmara de Fundão, Miguel Gavinhos.
O sistema de mobilidade integrada não deverá estar limitado aos cinco municípios [e] a articulação deve estender-se às duas CIM que compõem o território da Beira Interior.
No território beirão, os cinco municípios que se juntaram à entidade liderada por Ana Paula Vitorino para elaboração do plano de mobilidade integrada da Beira interior contam por 58% dos cerca de 310 mil habitantes das duas comunidades intermunicipais, e, segundo dados recolhidos pela AMT, tiveram uma redução da oferta de transportes coletivos para metade entre 2001 e 2021.
Em Belmonte, Castelo Branco, Covilhã, Fundão e Guarda, o uso de veículo individual nas deslocações habituais abrange 72% da população – valor médio, com Guarda e Belmonte a chegarem aos 76% –, acima dos 68% da média nacional e mais ainda dos 58% da Área Metropolitana de Lisboa.
Susana Baptista destaca a conclusão de que “os tempos de viagem em comboio entre as cinco sedes do município são nalguns casos à partida competitivos com o transporte rodoviário, embora falte inserir a componente da última milha”. Para esta ligação final entre a estação e os diversos destinos dos cidadãos, e considerando que na Guarda e em Belmonte as estações da linha da Beira Baixa (e, na Guarda, também da linha da Beira Alta) distam entre quatro e cinco quilómetros do centro urbano, o projeto-piloto da AMT preconiza a articulação com as redes de autocarros dos municípios e com aquelas que as duas comunidades intermunicipais da região estão atualmente a contratualizar, bem como com o Transporte de Passageiros Flexível (TPF).
Esta solução une meios alternativos ao autocarro e comboio, como os táxis por pedido para viagens a solo ou comunitárias, e, segundo Susana Baptista, é “muito importante para ampliar a acessibilidade aos transportes públicos”.
Para esta circulação, diz a AMT, urge criar o mesmo cartão do “passe” mensal e a mesma aplicação em todos os municípios, um serviço tarifário único que substitua as dezenas de títulos de transporte existentes na região e a quebra das fronteiras administrativas entre municípios, com partilha de serviços. Algo que a CIM do Oeste e a CIM do Alentejo já fazem, por exemplo.
Um dos exemplos da discrepância de condições entre cidadãos nacionais é deixado por Hélio Fazendeiro, chefe de gabinete do Executivo da Covilhã. Naquele concelho, o passe mensal para um serviço de autocarros com apenas três horários por dia custa 126 euros – em contraponto, relembre-se que o uso mensal de comboios, autocarros, metro e barcos em toda a Área Metropolitana de Lisboa custa apenas 40 euros por mês.
As opções de mobilidade nestes municípios incluem bicicletas elétricas em Castelo Branco, Covilhã e Guarda, neste caso desde há apenas dois meses, altura em que surgiu o serviço da Bird, que inclui 250 trotinetas elétricas e 50 bicicletas em 100 docas de estacionamento. Esta autarquia adiciona a oferta de incentivos para aquisição de bicicletas.