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Debates Legislativos: A Tragicomédia em Trinta Actos

Todas as manhãs acordo com uma questão existencial: será que ainda precisamos de oxigénio ou bastam-nos os debates políticos? Porque se há algo que os nossos insignes representantes da democracia nos têm oferecido é precisamente isso – uma sensação de asfixia programada em prime-time.

Chamam-lhes “debates para as legislativas”, mas na realidade são concursos de quem consegue sobreviver mais tempo sem dizer nada inteligível. Reduzidos a meia hora e a frases feitas, estas sessões constituem um programa que deveria, com toda a justiça, intitular-se “Cansados à Primeira Vista”. Os moderadores, tirando Hugo Gilberto (RTP), dão opiniões e querem ser protagonistas. Os políticos repetem o que já sabemos. As mensagens são enfadonhas. Com a excepção de uma ou outra tirada do Rui Tavares (Livre) e das calças de ganga e sinceridade de Paulo Raimundo (CDU), o aVentura grita, a Mariana chora e Montenegro foge.

Paupérrimos, parece que queimaram os livros do Sá Carneiro, do Soares, do Adriano Moreira e, vá, uns poemas do genial facho Ezra Pound. O resultado? Uma miscelânea de palavrório esguio que escorre pelas telecâmaras abaixo como uma amálgama de purgante mental.

O Instituto Nacional de Estudos Neurodegenerativos da Comunicação Política (organismo que acabo de inventar, mas que provavelmente já deveria existir) demonstra que assistir a estes debates causa danos irreversíveis ao cortex pré-frontal, precisamente a zona responsável por distinguir a verdade da treta. Um recente estudo conduzido pelo ilustre Professor Aníbal Faz-de-Conta concluiu que 85% dos espectadores desenvolve “síndrome de desorientação parlamentar”, caracterizada pela incapacidade de recordar o que foi dito trinta segundos antes.

Para melhorar os debates, os moderadores deviam puxar do charuto, fazer uma pergunta, olear os corpos dos beligerantes e apitar para começar. Talvez assim tivéssemos alguma autenticidade na liça. Os candidatos teriam direito a uma única frase completa; tudo o resto seria eliminado pela campainha da verdade – instrumento que vibra freneticamente sempre que detecta artifícios retóricos ocos.

O debate político, ao vivo, na rádio, nas televisões ou internetes são, do ponto de vista da comunicação, muito diferentes entre si. Os espectadores de um debate ao vivo apreendem melhor as mensagens e os protagonistas são obrigados a adaptar-se ao público. Um debate na TV é uma conversa protegida e sem tempo. E nestes dias em que a política soçobra aos paupérrimos dichotes, nada como levar estes debates às aulas magnas, aos estádios da bola, às praças de touros ou aos pavilhões de desportos.

Os nossos políticos precisam de um banho de leitura, conhecimento, cultura e humildade. E só a chusma ululante os pode pressionar. Sem o conforto das câmaras climatizadas, sem os microfones que amplificam o nada, sem a protecção dos realizadores que escolhem os planos mais favorecedores quando a lógica começa a fazer água.

Mas existe uma realidade mais crua. Não temos debates políticos – temos telecatalogados. Personagens que desfilam propostas como quem mostra um mostruário de parafusos numa feira de ferragens provincial. Seres que acreditam piamente que a solução para a crise habitacional ou para a saúde pública cabe numa vinheta de telejornal.

E quando a maré baixa, quando as câmaras se desligam, quando o país real se levanta para trabalhar no dia seguinte, eles continuam lá – analfabetos do ponto e vírgula, diligentes arquitectos de um país virtual onde as frases nunca precisam de terminar porque nunca começaram realmente.

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Joao Vasco Almeida
Joao Vasco Almeida
Jornalista 2554, autor de obras de ficção e humor, radialista, compositor, ‘blogger’,' vlogger' e produtor. Agricultor devido às sobreirinhas.

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