Na corrida para tirar o laranjal tudo contou; no Ribeiro do Reca a urna era móvel, ia de casa em casa, assim como vimos agora nos referendos feitos pela Rússia para validar as zonas ocupadas. O nosso inginheiro, o homem do faoj, e mais uns acólitos tudo fizeram para mostrarem trabalho, não se pouparam; de manhã cedo até á noitinha, bem noitinha, tudo fizeram, não deixaram ninguém para trás, a todos acudiram e a todos solicitaram, todos corresponderam. Sem fiscais oponentes foi um fartote. No final o trabalho resultou; menos de uma mão chão foi a vitória, não total, pois nos sítios mais pequenos e onde houve menos empenho a coisa não lustrou; por agora a câmara ficava dividida em dois. Se num lado era por quatro no outro era por dois.

Tudo dividido.
De início a estratégia era boa; o incumbente era tido por arrogante e mal-disposto, faziam-se de simpáticos e disponíveis, por um lado tinham um candidato presidente veterano nestas lides mas desconhecido, tinha andado na lavoura e pouco se perdia em comezainas e beberagens, juntaram o antenas, conhecido em todo o lado, amigo de todos, por outro o inginheiro e a sua trupe que dominava alguma coisa mas eram o aparelho, o tinóni que mobilizava o exército da paz e os transportes para todo o lado e por último a regente cujo o marido tinha uma vocação entre os humanos e os equídeos, influente em três urbes populosas ganharam de moto próprio numa e nas outras os esbirros cumpriram. Se na terra mais portuguesa de Portugal estava ganho as outras foi o diacho; derrotas.
O saco de gatos, arregimentado, estava calmo, ou nem tanto, até à vitória.
Depois, famintos atiraram-se à presa, cada um escolhia o seu espaço e rosnava aos outros, sempre que estes pretendiam algo ou mostravam interesse no pedaço do outro, o presidente usava a técnica do pau e da cenoura, para os ir acalmando.
Ao antenas, foi dado espaço para o contacto com a populaça, afinal onde se sentia bem, ao inginheiro foi dado o que se pretendia que ele soubesse; dinheiros, fundos, pessoal e coisas etéreas como turismo e cultura, estas últimas que nem o próprio tinha ideia do que seriam mas a trupe que o seguia queria; tinham ideias e planos, afinal o castelo da Bufa que tanto trabalho lhes tinha dado tinha de ser divulgado, o do faoj tinha uns casebres e pensou que com os camones a coisa ia explodir; já no tempo do comendador tinham insistido e tido benesses várias, agora com o nosso homem era canja. Tinham feito a cabeça ao incumbente e este tinha cedido mas tudo; queriam mais, muito mais.
A regente, bom para essa apenas havia um lugar para o qual não tinha capacidade, mas era o único disponível. Antes tinha-se esforçado e feito equivalências, lá tinha o diploma, uma coisa enorme e pomposa, mas em Coimbra não tinham ligado nenhuma e disseram que ou se punham finos e dentro da legalidade ou a escola fechava. Uma artimanha resolveu tudo; passava a interina até a tempestade amainar.
Estava tudo arrumado.
Eis senão, quando numa reunião privada, três semanas depois, estala a confusão e o inginheiro dá umas bofetadas no antenas. Tchap. Coisa violenta. Numa área que pertencia aos dois, mas que o inginheiro queria mandar, o antenas começou a falar alto. Tchap, tchap.
Complicado.
Tudo se soube, foi um alarido tremendo.
O problema é que o antenas achou que ia dar ordens nas freguesias e de seguida, passado muito pouco tempo após este incidente, abordou o marido da regente, sobre um assunto divergente, palavra puxa palavra, umas bofetadas e uns socos. Aqui as marcas ficaram visíveis, não havia como esconder.
Pior, a regente e o marido ameaçam mudar-se, começam os contactos com a oposição, rasgam o acordo. Exigem, querem mais; autonomia, dinheiro mas sobretudo o que foi prometido; ser directora. Por semanas, houve grandes oscilações, tremedeira permanente, ofensas e zangas de toda a ordem; arrigementação de aliados, contagem de espingardas. Foi complicado.
O presidente não tem alternativa; fica com as freguesias rosa, o antenas com as outras onde ameaçava e chantageava e não lhe acontecia nada, fazia o mesmo aos empregados que sabia serem da oposição e o inginheiro em roda livre com os amigos e a regente fica a fingir que era directora de qualquer coisa.
O que ninguém se apercebeu foi que no meio disto tudo, o inginheiro estava livre de amarras e fazia o que queria, martelando tudo e tendo verbas discricionárias à disposição. Só uns meses depois se apercebem da salgalhada. Para além de um financeiro de confiança, o presidente tinha para si os empréstimos e as assinaturas vitais.
O inginheiro ficava com 600 mil euros para fazer o que quisesse.
Havia que “comprar” muita coisa e muita gente, mas estes estavam garantidos.
Era o que ele queria!