O mundo está mesmo a mudar. Pela primeira vez ouço dizer que Israel não está em condições para travar guerra em tantas frentes, opinião vinda mesmo de analistas que consideram todas as ações bélicas vindas de Telavive justificadas e exemplo do seu poderio militar. Recordo a Guerra dos 6 Dias, que acompanhei em 1968, em Luanda, onde alguns colegas de liceu aplaudiam a vitória esmagadora de Israel, elevando o país à condição de potência militar incontestável no Médio Oriente e lhe deu imenso prestígio global.
Na verdade, para além do grupo islâmico do Hamas e dos Xiitas do Hezbollah, também Israel enfrenta ataques dos Houthis sediados no Iémen, a agitação continua na Cisjordânia e sofrem pressões do chamado sul global (antigo 3.º mundo), encabeçados pela China, Federação Russa e restantes Brics. Acresce que o Irão poderá entrar diretamente no conflito a qualquer momento, agora que as procissões de Ashura terminaram. Verdadeiro apoio apenas recebem dos EUA, enquanto a Europa se divide entre “estamos do lado da única democracia do médio-oriente” e a condenação do genocídio em Gaza, em nada contribuindo para tentar a paz. Não é fácil gerir a consciência pesada pelo holocausto, causado por um país europeu, a Alemanha. Acresce que cada vez se torna mais difícil considerar uma democracia um regime que pratica o apartheid, segregando os palestinianos, e diferencia cidadãos em função da religião que praticam.
A situação atual cansa o povo israelita, os voos estão cancelados há vários dias, a insegurança alastra de norte para sul do país (já morreram mais de setecentos soldados desde 7 de outubro de 2023) e a libertação dos reféns continua por resolver. Israel nunca teve uma guerra tão longa, quase onze meses seguidos.
Em plena discussão de um novo acordo de paz, que Anthony Blinken considera ser “a derradeira hipótese para acabar com o conflito em Gaza”, as partes continuam demasiado distantes. Temo que esse objetivo não seja alcançado em breve, mas os ventos não sopram a favor de Israel: o mundo está diferente e o país cada vez menos poderoso e com menos apoio internacional.
Quando serão cumpridas as decisões das Nações Unidas, sempre desprezadas por Israel? Quando haverá condições para reconhecer a Palestina como estado independente, decisão que agora até os EUA apoiam? Telavive está “em roda livre”, Netanyahu pouco se importa com os conselhos americanos, esquecendo que o seu futuro depende dessa superpotência. 70 anos depois, com novos contornos, o impasse continua, mas o risco duma guerra regional aumenta.